Uma gota d’água
Um grão de poeira
Uma semente de uva
Uma caneta vazia
A sombra do cascalho
A gente não se importa
Pelo que está bem fora
da agenda de negócios
Um pedido de abraço
O próprio abraço
O braço do filho
O abanar da cauda
O latido feliz
O próprio cachorro
O “eu te amo” da esposa
O amor pela esposa
A própria esposa
A gente não se importa
Pelo que está bem fora
da agenda de negócios
O clamor pela esmola
O pedido de socorro
A pandemia
O meteoro
A morte
A presença de Deus
A gente não se importa
Pelo que está bem fora
da agenda de negócios
E, assim, o que é absurdo
Perdeu o seu sentido
Mas, enquanto existir
Criança a sentir as gotas
De chuva na testa
A espirrar a poeira
A assoprar a semente de uva
Pela caneta vazia com a mira
Na sombra do cascalho
Enquanto houver uma criança
A fazer aviãozinho de papel
Com as folhas burocráticas
Da agenda de negócios
Enquanto houver uma criança
Haverá uma razão para viver.
Helton Chacarosque